domingo, 2 de novembro de 2008

Dois Lados da Mesma Moeda

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Universidade Federal de Goiás. O primor da educação superior do Estado. Nos dois campi da capital, circulam mais de vinte mil estudantes diariamente. São mais de 50 cursos oferecidos, incluindo graduações, pós-graduações, mestrados e doutorados. Somente no último ano mais de 28 mil pessoas se inscreveram para o processo seletivo vestibular, na tentativa de ingressar na almejada “educação pública de qualidade”.

Entretanto, esse ambiente tão bem visto pelo senso-comum pode não ser tão aprazível quando analisado mais profundamente. Dentre várias facetas que poderiam ser consideradas, enfatizo agora as discrepâncias internas em relação ao tratamento político-educacional dado entre os vários cursos da instituição.

No Setor Universitário, próximo à região central de Goiânia, encontra-se o Campus Colemar Natal e Silva, o Campus I. Em volta da Praça Universitária, estão os prédios dos chamados “cursos de elite” como Medicina, Enfermagem, Direito e as Engenharias. Detalhe explícito: os cursos possuem prédios próprios. Ali é possível encontrar construções muito bem estruturadas e esteticamente bonitas – somente comparáveis a edifícios de universidades privadas da capital.

Esses prédios possuem bibliotecas próprias, computadores à disposição dos alunos, salas climatizadas, equipamentos modernos, laboratórios muito bem equipados, elevado número de professores no corpo docente, e consequentemente mais qualidade de aprendizagem. Não foi à toa que o curso de Medicina da UFG, ganhou conceito máximo no último Exame Nacional de Desempenho de Estudantes, Enade. O próprio diretor da faculdade, Heitor Rosa, afirmou que “há uma série de fatores que levaram à faculdade a estar entre as oito melhores do país na categoria, mas o principal é a motivação dos estudantes, que realmente tem motivos para quererem se dedicar aos estudos”.

Já o outro Campus II, o Campus Samambaia, fica a quase vinte quilômetros da região central, no extremo noroeste da cidade. Isolada de quase tudo, a área rural foi uma doação dada à instituição na época da Ditadura Militar. Devido a esse motivo, as construções feitas ali foram especialmente planejadas como sendo uma benfeitoria contraditória. Os prédios foram feitos em valas no chão, como porões, com forma de blocos paralelepípedos, e com pequenas estruturas de saída. Dessa maneira, os estudantes da UFG estariam suscetíveis a ações da polícia caso investissem em algum movimento contra-ditadura.

No Campus II é onde se encontram os demais cursos da Universidade, divididos pela idade das construções. Os primeiros prédios são aqueles já descritos acima – dez “caixotes” interpostos, com ligações feitas por meio de corredores únicos, que transpassam as unidades. A maioria não possui ao menos paredes de concreto (as salas são divididas apenas por divisórias de madeira compensada), ou forro no teto (as instalações elétricas ficam à mostra até em prédios de Ciências Biológicas e de Química, oferecendo riscos principalmente aos usuários de laboratórios).

Além disso, esses edifícios já possuem mais de quarenta anos e não chegam nem perto da estrutura básica necessária para atender à comunidade acadêmica. Os laboratórios estão sucateados, não há reagentes no Instituto de Química, não há iluminação para o Estúdio de Televisão, não há nem mesmo computadores suficientes para que os estudantes possam fazer pesquisas simples... Outros exemplos são as estruturas de sala de aula: estudantes disputam entre si para compartilhar o mesmo ambiente, muitas cadeiras estão quebradas ou impróprias para uso, o sistema de ventilação encontra-se quebrado ou defasado em vários institutos, etc.

Já as outras construções do Campus II encontram-se afastadas das demais, sem vínculo físico. São as Faculdade de Letras, Artes Visuais e Música, o Centro de Aulas, a Agronomia, Veterinária e vários prédios administrativos. Alguns são tão distantes dos outros que é preciso um ônibus interno para transportar a comunidade acadêmica. (Note que os atrasos do ônibus existem, mas ainda não são discutidos aqui).

Outro fato a ser discutido é a defasagem do número de profissionais no corpo discente, que fatalmente não chega ao nível ter de cento e cinqüenta professores como o curso de Medicina. O curso de Jornalismo, por exemplo, conta com cerca de quinze professores ao todo (e vale a pena dizer que divide alguns deles com as outras habilitações de Comunicação Social, como Publicidade e Propaganda, e Relações Públicas – graduações que junto com Biblioteconomia, dividem o mesmo prédio).

A Universidade Federal de Goiás pode ser a de maior renome no Estado, pode ter os melhores e mais bem formados professores da região, e seu ingresso pode ser o sonho indiscutível de toda uma legião de vestibulandos goianos; mas devido a todas as problemáticas acima fica a dúvida do tipo de formação que realmente está sendo oferecida aos estudantes que nela se matriculam. Qual o motivo da enorme diferença entre os “cursos elitizados” e os demais? A verba é entregue de forma diferente pelo governo federal ou há um problema administrativo na universidade? As raízes da Ditadura ainda estão arraigadas nas entranhas dos cursos do Campus II? O engajamento de um estudante que possui todos os recursos de que necessita é diferente daquele que possui apenas os recursos possíveis, dentro da mesma instituição?

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Lorena Gonçalves - 2008 / 2009 - Todos os direitos reservados.
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