domingo, 2 de novembro de 2008

A Informação Goyana: comunicação em prol de Goiás

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* Artigo escrito em conjunto com Isabel Dias e Paula Falcão

Goiás era considerado um estado isolado devido a questões geográficas e simbólicas. Uma região localizada no centro-oeste do país, em que a distância dos centros econômicos e a falta de uma rede eficiente de transportes dificultavam o desenvolvimento econômico local. Além de dificultar o povoamento e a comunicação.

Enquanto as regiões mais desenvolvidas do Brasil, alicerçadas no setor cafeeiro desenvolviam o mercado interno, ampliavam os transportes e a indústria, Goiás permanecia estagnado. Simbolicamente, Goiás era uma terra sem identidade, situada no sertão psicológico de uma república recém estabelecida. Nesse sentido, o isolamento geográfico da localidade estava ligado também à falta de perspectivas referenciais européias. Já que o estado não tinha ligação com o mar, e conseqüentemente não havia ligação com o velho mundo, que definia os padrões culturais, artísticos e tecnológicos da época.

A economia goiana subsistia com base na agricultura e principalmente na pecuária, atividades exercidas de forma rudimentar. A agricultura via-se limitada pela não possibilidade de exportar o excedente, já a pecuária destacava-se como atividade econômica, que influenciava inclusive a política. Os detentores do poder político, em geral, eram pecuaristas.

O isolamento do território continuava, no entanto, sendo um grande obstáculo ao desenvolvimento pleno do potencial econômico goiano, penalizando, sobretudo, a agricultura, impossibilitada de exportar o seu excedente, em função da inexistência de meios de transporte modernos. A pecuária como única atividade capaz de alcançar os principais centros consumidores do país, continuava sendo o principal setor da economia do Estado, na mesma medida em que os setores pecuaristas controlavam a vida política em Goiás.
(ASSIS, 2005)

É nesse contexto que a revista A Informação Goyana surge em 15 de agosto de 1917, com intuito de integração e divulgação do estado de Goiás no cenário nacional, sem intenção de veicular notícias, mas sim, de ser elemento propagador da temática Brasil Central. Com finalidade educativa, política e publicitária a revista pretendia mostrar a potencialidade de Goiás, que era omitida pela grande imprensa, principalmente no que se diz respeito ao periodismo carioca.

Os fundadores d’A informação Goyana foram Henrique Silva e Americano do Brasil, porém este último abandonou o periódico um ano depois da fundação, para trabalhar como Secretário de Interior e Justiça de João Alves de Castro (seu futuro sogro) presidente do Estado de Goiás na época. A revista mantinha-se devido a subsídios do governo estatal, anúncios, assinaturas e doações. Além disso, o grande envolvimento de Henrique Silva com a revista fez com que ele tivesse muitos gastos, perdendo todo seu dinheiro quando as arrecadações que sustentavam a publicação diminuíram.

Henrique Silva, também foi o individuo que mais escreveu matérias para A Informação Goyana, 247 ao todo, quase dez vezes mais que o segundo maior colaborador, Americano do Brasil, que escreveu 26. Há indicativos inclusive que Silva coordenava a edição com muita rigidez, portanto, não havia um conselho editorial. Colaboradores e artigos eram cortados de acordo com a vontade do fundador, que também cuidava da distribuição do periódico. Assim, nota-se a pessoalidade da revista.

Apesar da inexistência de um conselho editorial, um artigo programa foi publicado no primeiro número do ano I da revista, e definiu os objetivos da produção e a necessidade de dispor de um espaço político mediante os outros estados do país. Para os idealizadores da revista, a comunicação consistia numa forma de ampliar os horizontes econômicos, algo comparável a uma rede de transportes, que também consistiu em uma luta do veículo. Houve grande questionamento quanto à interrupção da Estrada de Ferro Goyaz.

Ora, um dos primeiros esforços desta revista é precisamente collocar diante dos olhos dos capitalistas, dos industriaes e dos commerciantes as possibilidades econômicas sem conta do Estado mais central e menos conhecido do Brasil.
“A informação Goyana” traz portanto, um fim e um programma que bem a definem na imprensa brasileira.
(A INFORMAÇÃO GOYANA — nº 1— agosto de 1917)

A Informação Goyana caracteriza-se pelo regionalismo expresso não apenas no interesse que norteava a economia de Goiás, mas sedimentado em uma noção de nacionalismo. Tendência que se justifica pela defesa da unidade política do país, ou seja, não haveria crescimento do Brasil se as atenções não fossem voltadas também para o território central. Aqui se tem a mesma opinião partilhada pelos tradicionalistas da época, um deles era Alberto Torres, que chegou a ser presidente do estado do Rio de Janeiro (de 31 de dezembro de 1897 a 31 de dezembro de 1900) e preocupava-se com as questões da estruturação social e unidade do Brasil. Seu pensamento voltava-se para o interior, para o campo.

Assim esgotado a terra, deixamos também de formara nação. Abandonando a terra, e não cuidando da nação, abandonamos a Pátria, porque a Pátria é a terra, com o habitat, mas principalmente, para o sentimento e para a razão, [é] a nação, isto é, a gente. Fora disto, a palavra ‘Pátria’ não exprime senão uma imagem supersticiosa – como as de qualquer culto faitichista – ou uma falsidade convencional.
( Alberto Torres, 1914)

Sempre em busca do crescimento econômico de Goiás, a revista pautou a questão da extensão territorial e desqualificação profissional da população, assim como a necessidade de ocupação. A Informação Goyana chegou a atuar como mediadora do problema ocupacional. Como peculiaridade da revista, o respaldo que ofereceu à população diante de um interesse comum merece destaque, já que as matérias veiculadas não se limitavam ao factual. Neste caso, no entanto, a contribuição da revista para a ocupação se conteve a publicações de uma carta de João Campos, cônsul do Brasil na Alemanha.

Os nossos votos para que venham milhões de allemães para o Estado Central, que tanto precisa de braços.
(A INFORMAÇÃO GOYANA, encaminhamento da carta de João campos, cônsul do Brasil na Alemanha – 1924)

Mesmo sem ser partidarista A Informação Goyana teve suas origens no grupo xaverista, devido ao parentesco. Assim, além de terem ligação com a revista, colaboravam com o governo. Nesse sentido é notável, ao analisar o conteúdo do periódico, o empenho no governo de João Alves de Castro, o que ocorre posteriormente somente com Pedro Ludovico Teixeira, em 1930.

Sempre voltados ao enaltecimento da economia, os principais assuntos pautados pelo periódico diziam respeito ao potencial de agricultura das terras goianas, a diversidade ambiental em todos seus sentidos, a indústria eminente (ainda artesanal) e o comércio de uma região estrategicamente localizada no centro do país. Além disso, a revista discorreu sobre a falta de malha de transportes nas terras do estado, e ligava isso a questões educacionais e da saúde.

Em números, a principal editoria, por assim dizer, foi a economia que representou mais de 17% de todos os textos escritos para A Informação Goiana. Logo após seguem temáticas como os recursos naturais, notas e informações, transportes e a própria revista. Ao longo de seus 18 anos de existência, em todas suas edições, a revista se constituiu de exatamente 2229 textos, escritos por 188 colaboradores. Vale lembrar que em absoluto, Henrique Silva foi quem mais publicou artigos no periódico: mais de 11% do total.

Foram 213 números divididos em 19 volumes de uma produção mensal, que nunca ultrapassou 500 exemplares de tiragem. Mas que cumpriram seu papel ao definir de forma particular o cotidiano da região central do país tangendo eminentemente a economia e a vida goiana.

Nesse intuito de elevar Goiás a um novo patamar no cenário nacional, a Informação Goyana, muitas vezes se lançou a fazer campanhas em prol de assuntos relevantes ao estado, como o incentivo à cultura de café em solo goiano — na época uma das principais atividades alavancadoras da economia no país. Outra grande campanha foi em favor da transferência da capital federal para o Planalto central.

A revista A Informação Goyana foi pioneira em relação à divulgação da Marcha para o Oeste - um projeto do governo federal que incentivava a migração populacional do litoral para o interior do país, com o objetivo de implementar o povoamento.

O discurso nacionalista materializou-se através da “Marcha para o Oeste”, que expressava, na verdade, a necessidade do sistema econômico nacional de interagir novas regiões a dinâmica de produção e reprodução do capital. O governo federal preocupava-se em garantir o controle efetivo do território, procurando homogeneizar a distribuição da população no espaço.
(ASSIS, 2005)

Assuntos como o povoamento de Goiás, a transferência da capital goiana e da capital federal eram recorrentes na revista e faziam parte do movimento da Marcha para o Oeste. Em relação a capital federal, a convicção de que a mudança deveria ser feita foi tanta que a revista até ousou publicar um mapa da área delimitada para instalação do novo Distrito Federal.

No começo do século XIX já se falava nas vantagens em transferir a capital federal do litoral para o Brasil-Central. A revista foi um dos primeiros veículos que discutiu essa proposta e a divulgou incansavelmente.

Em 1933, Pedro Ludovico Teixeira com apoio do então presidente Getúlio Vargas transferiu a capital do estado, da Cidade de Goiás para Goiânia. Essa transferência foi uma das principais atitudes tomadas em relação à Marcha para o Oeste e consistiu em um passo para a modernização e a integração do estado com o restante do país.

Pedro Ludovico (...) procurou concretizar a idéia da mudança, consolidando seu poder sobre o estado e reafirmando a deposição do antigo grupo político. Para tanto foi imprescindível o apoio do Governo Federal de Getúlio, que apóia o projeto da nova capital como grande símbolo da Marcha para o Oeste.
( ASSIS, 2005)

Goiânia foi um marco na história de Goiás e A Informação Goyana lutava desde 1917 pela transferência da capital. Não há indícios concretos que a revista tenha influenciado Getúlio ou mesmo Pedro Ludovico na decisão de fazer uma capital moderna para o estado. No entanto, o fato da revista ser contemporânea aos governantes e discutir a temática de Goiás e da Marcha para o Oeste, essa é uma hipótese relevante e deve ser estudada.

Quase trinta anos depois da fundação de Goiânia, Juscelino Kubitschek, seguindo a marcha para o oeste, iniciada por Getúlio, construiu Brasília (1960) e transferiu a capital federal para o planalto central. Brasília foi o segundo grande marco na história recente de Goiás e na modernização do estado. Mais um sonho d’ A Informação Goyana realizado.

O fato é que Goiás cresceu e se desenvolveu muito desde a marcha para o oeste. Parte do estado que temos hoje é responsabilidade de um grupo de corajosos que sonhou com uma nova realidade e ousou dentro da capital federal (na época o Rio de Janeiro) falar sobre um lugar desconhecido e criticar o governo por ignorá-lo. Ali havia riqueza e possibilidade de crescimento, portanto, as adversidades não justificavam o abandono.

Entretanto, apesar de todos os benefícios apontados à revista, é preciso salientar que por se tratar de um veículo comunicacional que se baseava na leitura e interpretação, somente uma pequena faixa da população poderia ser considerada público alvo. Os níveis de analfabetismo no início do século XX chegavam a englobar 60% da população. Além disso, a linguagem d’A Informação Goyana não era de fácil compreensão, pois o material que era veiculado geralmente se tratava de relatórios presidenciais, relatos de viajantes e estudos técnicos, ou seja, tipos de textos que não se faziam presentes no cotidiano da população.

A Informação Goyana, reconheça-se, era de difícil leitura. Despreocupados, em algumas passagens, seus colaboradores utilizaram-se de citações na língua original das fontes consultadas, principalmente em francês, inglês, alemão e espanhol, o que é inaceitável em periódicos... (...)
(NEPOMUCENO, 2003)

Dessa forma, a revista era um veículo de caráter sofisticado — feita de eruditos para eruditos. A Informação Goyana visava um público alvo formado por intelectuais, políticos, pessoas com grande potencial de negócios, e pela imprensa da época. Por esse motivo o periódico não tinha grande número de assinantes, então, Henrique Silva encarregava-se de distribuir exemplares nas principais instituições da época para assegurar uma melhor circulação.

Não existem dados concretos que mostrem que a revista tenha chegado a um alcance nacional, entretanto há relatos de que A Informação Goyana perpassou as barreiras nacionais e chegou a outros países, como França e Uruguai.


Referências:

NEPOMUCENO, Maria de Araújo —“ O papel político-educativo de A informação Goyana na construção da nacionalidade” — 2003

ASSIS, Wilson Rocha — “ Estudos de história de Goiás” — 2005

FREIRE, Américo ; da Motta, Marly Silva; Rocha, Dora — História em curso, o Brasil e suas relações com o mundo ocidental, 2004
*Alberto Torres, 1914
http://www.ibge.gov.br/7a12/voce_sabia/curiosidades - O tamanho do Brasil

http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/dtbs/goias/goiania.pdf - Goiânia,Goiás GO.Histórico

http://www.prp.ueg.br/06v1/ctd/pesq/inic_cien/eventos/sic2005/arquivos/humanas/a_inf_goyana.pdf - A informação Goyana e a origem do discurso oposicionista à dominação política oligárquica no início do século XX

http://www.ige.unicamp.br/simposioensino/artigos/040.pdf - Divulgação científica e recursos naturais: O papel da revista A Informação Goyana na construção da imagem do Estado de Goiás, 1917 - 1935.

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